Canadá: saúde e imigração - desdobramentos

No ano passado, eu tinha escrito sobre as contradições da postura oficial canadense com relação a imigrantes e refugiados, ainda mais envolvendo encargos ao já deficiente sistema de saúde.

Em particular, havia uma grande polêmica em torno do caso de Juana Tejada, uma filipina que veio para o Canadá como babá, cumpriu aquele esquema de trabalhar aqui 3 anos, longe da família, e então conquistar um visto canadense. Só que, nos procedimentos finais, ela recebeu o diagnóstico de câncer e, inicialmente, teve o visto negado.

Houve muito debate. Gente dizendo que esse esquema é frouxo demais, porque uma mulher como ela trabalha aqui 3 anos e, ao conseguir o visto, traz a parentada toda, um monte de gente desqualificada que acabaria vivendo às custas do governo. Mas a maioria dos argumentos pregava o contrário: que falta muita mão-de-obra aqui, que a maioria dos imigrantes, mesmo vindo de países subdesenvolvidos, tem mais qualificação do que muitos canadenses (o que é verdade) e está disposta a fazer serviços que muitos branquinhos se recusam a fazer. Além disso, o argumento mais forte era de que ela fez todos os sacrifícios necessários, seguiu todas as regras e cumpriu com os compromissos, então agora é a vez do governo fazer sua parte e lhe conceder o visto. Só que já de antemão se sabia que ela precisava "passar" nos exames de saúde para receber o visto.

Enfim, era uma situação bem complicada.

Afinal, deixaram que ela ficasse. E ela recebeu o visto permanente, e trouxe o marido e alguns irmãos. E foi tratada em hospitais públicos (até porque não existe hospital particular aqui).

Foi um precedente importantíssimo. Por causa dessa vitória dela, as regras de imigração -- para o caso específico de trabalhadores braçais que se enquadram nesse caso -- estão mudando.

Hoje saiu o obituário da Juana Tejada. Bonito, forte e comovente. Ela é retratada como heroína silenciosa. Sem nada de polêmica.

É essa sensação de que a gente está num país onde, apesar das falhas e inconsistências, apesar da burocracia pentelha como é da natureza da burocracia, apesar de passar quase metade do ano abaixo de zero, apesar de não saberem cortar um boi do jeito mais óbvio, mesmo assim existe um vestígio de racionalidade e bom senso, que faz a gente se matar de trabalhar e querer continuar aqui.

(Isso e duas breves visitas ao consulado brasileiro.)

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A Carol esqueceu de mencionar: aqui também não tem samba, bloco de rua, praia, futebol, Rei Momo, Big Brother, paçoca e farofa de ovo. E a cachaça Pitú custa mais de 20 dólares na LCBO.

Tudo bem. Pensando bem, talvez não estejamos tão mal assim.

Mas até que uma farofinha de ovo vai bem...

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